segunda-feira, 1 de agosto de 2011

CURSO PREPARATÓRIO PARA DISCIPULADORES LIÇÃO 6: A EDUCAÇÃO CRISTÃ E A ESSÊNCIA DO DISCIPULADO

LIÇÃO 6: A EDUCAÇÃO CRISTÃ E A ESSÊNCIA DO DISCIPULADO
“João 6.45 nos mostra que quando a conversão nasce do ensino e não apenas da pregação, os resultados são certos e perenes. Paulo deixou claro que, prioritariamente, a função das Escrituras é o ensino do povo de Deus (Rm 15.4)” [1]

Não é muito difícil perceber, que a relação do ensino e o seu papel no cumprimento da Grande Comissão, não é ativa e verdadeiramente eficaz, mesmo na era da informação fácil, através de internet e a maior existência dos programas evangélicos, desde as correntes mais tradicionais até as pentecostais e neopentecostais ocupando um maior espaço na TV aberta. Mesmo levando em consideração que em muitas igrejas ainda existe o abençoado departamento da escola bíblica dominical, que segundo historiadores, foi iniciado por Robert Raikes, que viveu entre 1785-1811, iniciando este trabalho com as crianças de cortiços na Inglaterra, e hoje é ainda referência de ensino em muitas denominações cristãs. O ensino cristão ainda não tem desempenhado o seu papel de modo eficaz mesmo na era moderna, onde há cultos de ensinos, seminários teológicos, cursos de reciclagem para professores da EBD e numa época em que a literatura evangélica tem atingido um impressionante espaço.
Por quê? Apesar deste maravilhoso contexto que a igreja evangélica moderna brasileira vive, grande parte dela apresenta uma séria deficiência na área de educação cristã, manifesta em pelo menos três áreas, e que afeta diretamente o desempenho bíblico da grande comissão, que podem ser assim delimitados para melhor entendimento: 1) O conteúdo do ensino apresentado; 2) O individualismo cristão e 3) Uma compreensão errada no objetivo da educação cristã.
O CONTEÚDO DO ENSINO APRESENTADO
Basta uma rápida observação dos programas evangélicos cristãos da igreja moderna, para constatarmos que há uma discrepância do ensino de determinadas denominações evangélicas e os ensinos fundamentais da Palavra de Deus. Uma hermenêutica incorreta dos textos sagrados tem dado base para justificar biblicamente as filosofias humanas e seus desejos pessoais. Diante deste quadro temos ouvido alguns ensinos que levam o cristão a uma vida alienada dos princípios bíblicos, como por exemplo, em um destes programas de TV, uma pregadora ensinava que as promessas que Deus tinha prometido para Abraão eram riquezas materiais e como nós somos hoje filhos de Abraão, temos sim a promessa para ficar ricos, como tentativa de justificar a teologia da prosperidade. Na maioria dos púlpitos evangélicos, vemos que o conteúdo dos ensinos tem sido deficiente, levando em conta que biblicamente, a pregação contém ensino, como vemos, por exemplo, em Jesus e nos apóstolos. Muitos pregadores da igreja evangélica moderna trocam a mensagem bíblica por “emocionalismos” e “palavras de bênçãos” e “palavras de vitória” que mais mexem com o ego e as emoções dos ouvintes.
A ausência do ensino cristão arma o palco para a apostasia. (ver Hb 6.1ss) [2]

            Até mesmo nos hinos, que são outra forma de transmitir um ensinamento, são carentes de base bíblica, e cheias de um triunfalismo que transformam o SENHOR E DEUS num mero cedente dos desejos dos crentes.
            É urgente um retorno ás Escrituras. O ensino faz parte da ordem de Jesus para cumprirmos a grande comissão, com o objetivo de fazermos discípulos:
Portanto, ide, ensinai todas as nações,... Ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado. [3]

            Podemos ensinar através de palavras, pelas mensagens dos hinos, até mesmo pelo nosso exemplo, mas o conteúdo deste ensino deve ser bíblico, evangélico e cristocêntrico.  A mensagem de Jesus e dos apóstolos, bem como da igreja primitiva, apesar de estar inserida em um contexto sócio-cultural, era evangélica e cristocêntrica. Jesus Cristo e seus ensinamentos nunca podem deixar de ser à base do ensino cristão, pois este tem por objetivo fazer discípulos do Senhor Jesus Cristo, e não de qualquer líder ou denominação. No discipulado cristão deve haver um ensino claro e verdadeiro das Escrituras em temas quanto ao pecado, o plano da salvação, da pessoa de Cristo, Espírito Santo, justificação, perseverança em meio ao sofrimento, a esperança do crente, santificação, enfim, tudo relacionado à pessoa de Jesus Cristo e sua obra:
E todos os dias, no templo e nas casas, não cessavam de ensinar e de anunciar a Jesus Cristo. [4]
           
            Esta negligência dos pentecostais com o ensino, por exemplo, é histórica. Rick Nañez em seu livro Pentecostal de coração e mente, mostra de forma contundente que as raízes do antiintelectualismo pentecostal vêm desde seu fundador, Charles Parham, que recusava outro tipo de ensinamento ou comentário ou interpretação de estudiosos históricos na exposição bíblica. Ele via todos aqueles antes dele como indignos de confiança em termos de ensino doutrinário e exposição bíblica.[5] Sua escola, a Bethel Bíble School, fundada em 1900, tinha em seu currículo basicamente da leitura da Bíblia e de apresentação de comentários pessoais sobre vários textos bíblicos. Este tipo de pensamento ainda é presente na vida de muitos cristãos pentecostais e neopentecostais que quando são confrontados com a necessidade de conhecer e estudar as doutrinas das Escrituras Sagradas se esquivam respondendo “eu aprendo com o Mestre” ou “Teologia deixa o crente frio irmão” ou ainda “É o Espírito Santo que me revela a palavra”. Este modo de pensar tem levado os cristãos a darem mais valor as suas experiências pessoais, do que aos ensinamentos da Palavra de Deus. Como fazer discípulos de Jesus Cristo baseando-se apenas nas experiências espirituais e individuais? Sem dúvida o povo de Deus ainda hoje se perde por falta de conhecimento[6], e isto está presente na mensagem e ensinamentos de grande parte da igreja evangélica atual.
INDIVIDUALISMO
            Outro fator que podemos listar como ‘pedra de tropeço’ do verdadeiro papel do ensino no cumprimento da Grande Comissão é o individualismo.  Não é individualidade – o caráter especial, particularidade ou originalidade de uma pessoa -, mas individualismo – conduta egocêntrica, onde o indivíduo se considera como a realidade mais essencial ou elevada.
            Este tipo de comportamento é abundantemente presente no cristianismo atual, podendo ser atribuído aos ensinamentos atuais onde a teologia da prosperidade e o egocentrismo tem estado constantemente presentes nas mensagens evangélicas de grande parte da igreja moderna. É também característica da maioria dos membros das grandes igrejas, das massas, dos grandes ajuntamentos e reuniões, que logo após o término das reuniões, cada um segue a sua vida. Não existe aquela comunhão. É também conseqüência do próprio comportamento de muito de seus líderes que ministram ao povo em grandes reuniões ou em seus programas de rádio e TV, porém são acessíveis apenas a um seleto grupo, longe da maioria dos membros das denominações que representam.
            Este comportamento expresso por tais líderes influenciam seriamente na vida de seus membros, que passam a adotar atitudes semelhantes e deixam de participar de uma vida de comunhão, onde uns aos outros se exortam e levam as “cargas uns dos outros” [7] no caminho da fé e do discípulo cristão.
            Creio que se estivesse vivo hoje, Richard baxter (1615-1691) seria um verdadeiro João Batista pregando no deserto contra o modo como o ministério pastoral é exercido por muitos nos dias de hoje, sobre tudo em relação ao ensino cristão. Ele exerceu um importante ministério de ensino na Inglaterra, em Kidderminster, um vilarejo com cerca de 2 mil pessoas e em torno de 800 lares, “um povo ignorante, rude e dado a folia”[8] que foi abençoada com seu ministério pastoral de aconselhamento pessoal e discipulado, dando uma grande contribuição para melhorar a prática da instrução pessoal. Baxter podia com autoridade incentivar através de seu exemplo outros pastores seguirem seu exemplo na prática do ministério pastoral. Exortações como estas eram dadas aos seus alunos no ministério pastoral, que parecem profecias dos tempos que vivemos hoje:
“Irmãos, se a salvação das almas for realmente a sua missão para a glória de Deus, certamente desejarão realizá-la tanto no púlpito quanto fora dele. (...) Entretanto, se os senhores apenas almejam o ministério do púlpito, não serão ministros exceto quando estiverem pregando. Nesse caso, não serão dignos do respeito devido aos ministros de Cristo.” [9]

“Em vez do ajuntamento de tantos pastores sem Igreja nos grandes centros, providenciariam mais pastores nas Igrejas, a fim de permitir o trabalho mais pessoal e familiar. Enquanto houver tantos pastores carnais que pretendem ser “donos” de Igrejas, os líderes eclesiásticos não terão maior motivo para ajudar no trabalho de Deus e serão tentados por tais pastores mundanos a manter suas posições abastadas e confortáveis, em prejuízo da Igreja.”[10]

            Baxter não estava sendo extraordinário. Apenas seguia o exemplo deixado nas escrituras sagradas. Basta ver como Jesus gastava tempo no preparo de seus discípulos em particular e não apenas dos doze:

“E quando se achou só, os que estavam junto dele com os doze interrogaram-no acerca da parábola. E ele disse-lhes: A vós vos é dado conhecer os mistérios do Reino de Deus, mas aos que estão de fora essas coisas se dizem por parábolas” [11]


            E este ministério do ensino ele deixou como parte principal da Grande Comissão, para que os apóstolos e conseqüentemente a sua Igreja ensinassem a observar tudo o que ele tinha ordenado (Mt 28.20). E depois do pentecostes, vemos que eles seguiram este mandamento fielmente. Pedro foi proibido de ensinar em nome de Jesus, ordem que ele não obedeceu (At 4.18; 5.21, 24). Paulo também tinha um admirável ministério de ensino, como vemos em diversas passagens do livro de Atos dos Apóstolos bem como em suas demais epístolas, porém podemos ter, por exemplo, desse zelo pessoal pelo discipulado e ensino, o conselho que ele dá ao seu discípulo Timóteo, sobre o defender e ensinar a Palavra, ante a sua iminente execução:
“Portanto, não te envergonhes do testemunho de nosso Senhor, nem de mim, que sou prisioneiro seu; antes, participa das aflições do evangelho, segundo o poder de Deus,... para o que foi constituído pregador e apóstolo, e doutor dos gentios; por cuja causa padeço também isto, mas não me envergonho, porque eu sei em quem tenho crido e estou certo que é poderoso para guardar o meu depósito até àquele Dia. Conserva o modelo das palavras que de mim tens ouvido, na fé e na caridade que há em Cristo Jesus. Guarda o bom depósito pelo Espírito Santo que habita em nós.” [12]

            Oremos para que o Senhor da seara nos dê este coração, assim como levante obreiros para sua obra com este espírito. Através de obreiros com este coração na obra de Deus, a igreja terá exemplos de pessoas que seguem os ensinamentos bíblicos sobre o discipulado, e poderá cumprir o seu papel socializador no ingresso do novo convertido à igreja.
ERRADA COMPREENSÃO DO OBJETIVO DA EDUCAÇÃO CRISTÃ
            A educação cristã não tem o objetivo apenas de transmitir conhecimentos teológicos para os seus ouvintes, porém tem o objetivo de levarem-nos a uma mudança de vida, a ensiná-los a viverem o cristianismo. Ser discípulo de Cristo, não se resume apenas em ter um bom conhecimento teológico, porém viver imitando o Senhor Jesus, seguindo os seus passos:
 Ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado... (Mateus 28.20)
Pelo que, rejeitando toda imundícia e acúmulo de malícia, recebei com mansidão a palavra em vós enxertada, a qual pode salvar a vossa alma. E sede cumpridores da palavra e não somente ouvintes, enganando-vos com falsos discursos. Porque se alguém é ouvinte da palavra e não cumpridor, é semelhante o varão que contempla ao espelho o seu rosto natural; porque contempla a si mesmo, e foi-se, e logo se esqueceu de como era. (Tiago 1.21-24).
            A educação cristã será eficaz no discipulado, quando o conteúdo deste ensino for bíblico, e a comunhão entre os irmãos servir neste propósito de transmitir as verdades da Palavra de Deus através da comunhão e do ensino e exemplo pessoal, tendo em vista que o objetivo principal do discipulado não é apenas uma transmissão de conhecimentos, mas levar o novo convertido a viver um cristianismo puro e simples, fundamentado na Palavra de Deus, no imitar a Jesus Cristo, o verdadeiro discipulado cristão.
Ev. Alan G. de Sá


[1] DORNAS, Lécio. Vencendo os inimigos da Escola Dominical. 2ª edição. São Paulo: Hagnos, 2002, p.17.
[2] CHAMPLIN, Russell Norman. Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia. 7ª edição, São Paulo: Hagnos, 2004, p.390.
[3] Mateus 28.19-20.
[4] Atos 5.42.
[5] NAÑEZ, Rick. Pentecostal de coração e mente: um chamado ao dom divino do intelecto. São Paulo: Editora Vida, 2007, p.104.


[7] Gálatas 6.2
[8] BAXTER, Richard. Manual pastoral de discipulado. 1ªed. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p.9
[9] Idem, p.47.
[10] Idem, p.162.
[11] Marcos 4.10-11.
[12] 2 Timóteo 1.8, 11-14.

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